terça-feira, 21 de janeiro de 2014

A demonstração de Pedro

O apóstolo aprendeu a praticar o Cristianismo que o Mestre havia ensinado

        O livro dos Atos dos Apóstolos relata as atividades dos primitivos Cristãos e sua organização como igreja, a do cristianismo primitivo baseado em obras de fé. O livro mencionado traz muitas realizações dos apóstolos, mas detalha o trabalho de Pedro e Paulo. O primeiro conviveu com Jesus Cristo e testemunhou pessoalmente as grandiosas obras do seu ministério. Aprendeu com seu Mestre algumas lições que lhe pareceram duras e penosas por causa de conceitos empedernidos que precisava deixar para trás. Aprendeu duramente, mas aprendeu. Tanto que ele mesmo protagonizou no seu trabalho apostolar, momentos de grande repercussão entre a população.

Uma das curas efetuadas me chama muito a atenção e me faz pensar de como seria a cena hoje em dia. O capítulo 3 dos Atos relata que, na cidade de Jerusalém, um coxo de nascença era levado à porta do templo para obter seu sustento com as esmolas dos que freqüentavam a Casa de Deus. Pedro e João, como de costume, foram ao templo a fim de orar. Ao serem abordados pelo homem coxo, desenvolveu-se entre eles um diálogo sem precedentes cujo desfecho foi a cura do aleijado. Uma cura tão radical e rápida que causou um alvoroço entre os que a presenciaram.

A porta do templo junto à qual ocorreu o incidente, era chamada de Formosa por causa dos maravilhosos entalhes que continha. Uma verdadeira obra-de-arte. Provavelmente era a entrada principal, por onde passava a maioria das pessoas. Um ponto estratégico para quem desejasse contato visual com os passantes. O coxo esmolava ali, contando com a compaixão e bondade das pessoas de bem que iam buscar inspiração ou purificação. O nome dele não é conhecido. Poderia ser qualquer um. Isto pode ser visto como se ele representasse um homem genérico de qualquer época, inclusive hoje; por exemplo, você, eu, nós, eles.

Os apóstolos foram abordados também, mas não tinham nenhum “trocado” para o pobre sofredor, cujas enormes necessidades humanas eram supridas pelos poucos recursos conseguidos com as doações. Logicamente esperava de Pedro ou de João algo de bom. Expectativa essa que foi aguçada pelas palavras de Pedro: “Olha para nós”. Mas antes de falar ao mendigo Pedro “fitando-o” discerniu suas necessidades.  Será que Pedro se lembrou de quando andara por sobre o mar enquanto olhava para Jesus, e que tivera problemas ao desviar dele o olhar? Pedro queria que o pedinte olhasse para ele, deixando de olhar em redor, de reparar na opulência dos outros em contraste com sua miserável situação, e parasse de encolher-se: “Coitadinho de mim!”.

Ele olhou para eles, esperando receber alguma coisa” diz o relato. Ele prestou atenção ao apóstolo na expectativa de receber algo de bom. Mas a resposta de Pedro poderia ter sido frustrante se terminasse na primeira parte: “Não tenho prata nem ouro”. Não era por isso que o homem esmolava? Por esmolas, moedas de prata ou ouro? E se o apóstolo tivesse algum dinheiro no bolso, será que teria dado algo ao mendigo para sentir-se socialmente realizado por ter “ajudado” um pobre? (Por acaso é assim que nos sentimos quando damos uma esmola a um pedinte?) Pedro não tinha riquezas deste mundo, mas era rico em espiritualidade, e estava disposto a compartilhar seu tesouro com aquele ser humano, rico em necessidades. O apóstolo  pode ter discernido no olhar do coxo um fio de esperança, uma débil aceitação de valores espirituais. Será que o coxo de nascença não teria ouvido das curas realizadas pelo Nazareno que havia poucos anos fora crucificado e ressuscitara dentre os mortos? Ele era contemporâneo de Jesus em Jerusalém, mas talvez não tivera a oportunidade ou a coragem de ir pessoalmente pedir ajuda a Ele. O esmoleiro não conhecia Pedro nem João; não fazia a mínima idéia do que podia vir desses cidadãos comuns. Mas havia no ar uma certa expectativa diferente, um clima que nunca pintara nas relações do pedinte com seus doadores.

O que tenho, isso te dou”, continuou Pedro. Chama-me a atenção que ele não disse: “DO que tenho”, mas “O que tenho”. Sua disposição não era dar um pouco do que tinha, mas dar tudo o que tinha. Pensando quantitativamente a proposta de Pedro parece mal formulada. Mas espiritualmente estava correta. Os tesouros ou os bens materiais são vistos em quantidades: “Tanto disso, tanto daquilo, tanto para mim, tanto para ti”. Entretanto o tesouro espiritual é avaliado pela qualidade. Um pouco de amor, vale tanto como todo amor. Um pouco de espiritualidade, vale tanto como toda espiritualidade. Um pouco de bem espiritual, vale tanto como todo bem. Não há, pois, quantidades; há, sim, qualidade. O tesouro do Espírito, a fonte de todo bem, para ser infinito não pode conter quantidades, que em si são finitas e limitadas. Se basearmos nossa vida nas quantidades testemunhadas pelo sentido material, estaremos tentados a acreditar que o bem é limitado, ou que não temos o necessário. Pedro tinha consciência disso  e deu ao pobre todo seu amor, sua fé, sua compreensão espiritual. Mas nem por isso ficou privado de gozar desses bens espirituais.

O apóstolo, com toda longanimidade despejou seus tesouros de compreensão espiritual sobre o interlocutor, que já não era visto como aleijado, pois, do contrário, não o poderia amar como filho de Deus nem lhe dizer: “Em nome de Jesus Cristo, o Nazareno, anda”. Que autoridade e fortaleza espirituais foram demonstradas por Pedro nessa ordem! Isso ele aprendera com o Mestre e também retratava a elevação espiritual alcançada pelo intrépido discípulo. Não muitos anos antes ele havia dado uma resposta convincente à interpelação do Mestre: “Quem diz o povo  ser o Filho do homem?” (Mat. 16: 13-16). Simão Pedro respondeu: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo”. Em nome desse Cristo do Deus vivo, Pedro pôde quebrar o jugo escravizante que aquele homem sofrera desde seu nascimento. Agora ele estava livre!

Diz o relato bíblico que Pedro “tomando-o pela mão direita, o levantou”. Mão direita de Pedro ou do paciente? Aqui, novamente, o significado espiritual é o importante. Pode-se dizer que o “lado forte” de Pedro tomou o “lado forte” do enfermo. Ou seja, o Apóstolo com sua fé puxou para cima, elevou, a fé do homem. A Bíblia tem muitas referências ao poder infinito da “destra de Deus”. Vale dizer que Pedro expressou o poder de Deus conscientemente, trazendo à luz o efeito regenerativo e fortalecedor desse poder infinito na vida e na consciência dos homens. A ação de Pedro repetiu o método de Cristo Jesus descrito por Mary Baker Eddy século XIX no livro Ciência e Saúde com a Chave das Escrituras*: “Jesus via na Ciência o homem perfeito, que lhe aparecia ali mesmo onde o homem mortal e pecador aparece aos mortais. Nesse homem perfeito o Salvador via a própria semelhança de Deus, e esse modo correto de ver o homem curava os doentes” (pp. 476-7). Eu encaro essa declaração como uma regra de cura espiritual.

A parte impressionante aos olhos dos mortais veio a seguir. Diz o relato que após Pedro tomar o homem pela mão direita, “imediatamente seus pés e tornozelos se firmaram; de um salto se pôs em pé, passou a andar...”. Para alguém que nunca havia usado os pés e as pernas, poder andar era algo indescritível.  Que sensação de liberdade! Não é de admirar que o ex-coxo entrasse no templo “saltando e louvando a Deus” (notem que não louvava a Pedro); não conseguia conter-se. Mas onde ficaram as “leis” orgânicas que hoje afirmam categoricamente que um homem adulto coxo de nascença precisaria, talvez, um ano ou mais de fisioterapia para poder reforçar suficientemente os músculos e tendões a fim de sustentar um homem de pé. Nem falo de andar e saltar. A cura deu-se imediatamente, isto é, sem demora. Parece impossível ao saber humano. No entanto, para o saber Divino, a Mente de Deus, nada é impossível. Tanto que a força criadora do universo, que fez “homem e mulher” à imagem e semelhança de Deus, portanto perfeitos e harmoniosos como o Pai-Mãe, também mantém a criação no estado original. Se esse poder pode criar, também pode manter e regenerar! O poder para tanto reside na onipotência. “Tudo quanto Deus faz durará eternamente”, diz o sábio Salomão em Eclesiastes (3:14). E segue: “nada se lhe pode acrescentar e nada lhe tirar”. Isso tem lógica, pois se o que Deus criou é bom, então por que mudar?

Diante de tal demonstração de poder da fé na ação do Cristo, é natural a “admiração e assombro” de que foi tomada a população. Hoje seria a mesma coisa. Não é comum ver-se coxos ou paraplégicos saírem andando depois de alguém orar por eles. Mas isso não quer dizer que seja impossível. O poder atuante no incidente com Pedro e João, é exatamente o mesmo que atua hoje, pois é o poder do eterno Deus, sempre bom e presente. Nossa tarefa é aprender a lançar mão desse recurso, que só atua de acordo com a vontade de Deus, nunca da nossa. Não adianta orar para o restabelecimento dos enfermos, desejando que o poder infinito atue no sentido do resultado delineado por nós. Nossa oração deve elevar nosso pensamento a Deus e deixar a ação aos cuidados da vontade de Deus. Temos de deixar o Espírito agir, a Verdade corrigir o erro, o Amor divino afastar o medo. Quando oramos o Pai-Nosso, não dizemos: “Faça-se a Tua vontade”? (Mat. 6:10). Pois sabendo que a vontade do Pai é sempre para o bem, a saúde, a abundância, estaremos muito próximos de vivenciá-los em nossa experiência humana.


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