Cabe ao homem
tentar compreender Deus?
Há algum tempo participei de uma
reunião com representantes de entidades sócio-assistenciais, onde compareci
como representante de uma ONG ambiental. O debate sobre os problemas sociais em
nossa comunidade, principalmente com a juventude e sua relação ao consumo de
drogas, incluía uma busca frenética de soluções que, ao final, pareciam
longínquas ou inatingíveis, ou muito distantes do horizonte visualizado pelos
debatedores. O trabalho voluntário nessas organizações é digno de
reconhecimento, quando se vê o desprendimento dos participantes na labuta por
atendimento aos menos favorecidos. O grande problema comum nessas entidades é a
escassez de recursos, sejam públicos sejam privados. Disse alguém: “a vontade
de ajudar é sempre maior que o dinheiro disponível”.
Em meio à troca de idéias ocorreu-me
uma frase que li em Ciência e Saúde com a
Chave das Escrituras*: “É nossa
ignorância a respeito de Deus, ...o que produz aparente desarmonia, e
compreendê-Lo corretamente, restaura a harmonia” (p. 390). Pensei comigo se
a regra seria aplicável aos problemas sociais coletivos. Pensando mais um pouco
conclui que sim, posto que os problemas coletivos nada mais são que a somatória
de muitos problemas individuais aos quais a regra é plenamente aplicável.
Por que é importante compreender
Deus corretamente? Porque a partir dessa
compreensão poderemos compreender o que o homem realmente é. Aqui a designação
Deus representa um conjunto de características espirituais infinitas e
ilimitadas no tempo e no espaço, as quais estão em toda parte há muitos
milênios, mais precisamente desde a eternidade. Essas características não são
perceptíveis aos sentidos físicos, mas são cognoscíveis pelos sentidos
espirituais. Este entendimento a respeito de Deus é o que devemos aplicar ao
entendimento correto do homem. Por isso a visão do que o homem realmente é não
pode estar baseada no testemunho dos sentidos físicos, ou o que vemos, ouvimos
e sentimos. A raiz dos problemas humanos está precisamente nesse modo enganado
do homem ver a si mesmo. O ser do homem real (designação genérica para homens e
mulheres) é muito mais do que vemos e ouvimos. Como obra prima da criação o
homem expressa―traz à luz―a perfeição da criação divina, aquela fonte infinita
de luz, de inteligência, de amor e vida que é Tudo-em-tudo.
Enquanto o homem se vê como um mortal
limitado, cheio de problemas e limitações de toda ordem, é isso exatamente que
ele tem em sua consciência; e tudo o que o homem, de modo geral, mantém no
pensamento isso se concretiza na sua vida. Assim ele sofre de doenças, penúrias
financeiras, relacionamentos alquebrados, submissão aos limitantes parâmetros
de tempo, idade, hereditariedade. Por que? Porque ele primariamente mantém no
pensamento essas situações negativas. As formas visíveis são apenas
manifestações de formas de pensar. Ele vivencia seus pensamentos. Exemplo dessa
afirmação é o que se observa em uma pessoa hipnotizada. No transe hipnótico, a
pessoa sente o que o hipnotizador ordena; pode não haver nenhuma evidência
física de frio, por ex, mas o hipnotizado sente frio, bate queixo, aconchega
seu agasalho. É real o que a pessoa sente? Para os observadores não, mas para
ela sim. A pessoa sente o que o pensamento dela acredita seja real.
Para safar-se de seus problemas o
homem precisa aprender a olhar para cima; vale dizer para fora do mundo
terrenal, material, onde circula o homem adâmico. O que a pessoa hipnotizada
precisaria fazer para sair de sua sensação de frio? Acordar, ou seja mudar seu
pensamento, sair do transe e tomar posse de seu pensamento. A Bíblia tem um
versículo que vale a pena lembrar aqui: “Olhai
para MIM e sede salvos” (Isa 45: 22) Este MIM é Deus, o Espírito, aconselhando,
instruindo, Seus filhos a desviarem seu olhar da fisicalidade para a espiritualidade, para lá
encontrarem a solução de seus problemas. Essa visualização do espiritual equivale
ao despertar do pensamento, ou mudar a base de seu pensamento; ação que deve
ser constante, mantida num nível permanente e não intermitente, pois isso
deixaria o pensamento girando em altos e baixos sem fixidez.
Para compreender a Deus, o cristão
tem nas Sagradas Escrituras a melhor fonte de informação e instrução. Um estudo
esclarecido e detido do conteúdo desse compêndio revela que Deus não é um ser
antropomorfo e limitado; mas é ilimitado, infinito, eterno, todo-poderoso,
onipresente, onisciente, bom, perfeito, puro, amoroso, Vida, Verdade, Amor,
Espírito, imutável, misericordioso, fiel, e assim por diante. Este conjunto de
características é o que devemos ter em mente quando falamos de Deus, como
também devemos saber que elas não estão distantes em um céu azul na imensidão
do espaço sideral. Esse ser coletivo é o conceito por trás do texto bíblico
eloísta a respeito do Gênesis. Ele é plural; por isso o texto de alguns
versículos coloca Deus dizendo “façamos”: “Façamos
o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança...” (Gen. 1: 26).
O homem é imagem e semelhança de um
conjunto de características espirituais; não esqueçamos disso. Assim, é correto
falarmos a nosso respeito no plural; nosso “eu” verdadeiro não é singular, é
plural. Ver o homem sob este enfoque arrebata nosso (meu) pensamento a uma
plataforma mais elevada e junto com ele nossa (minha) vivência humana. Nesse
plano mais elevado e espiritual, vemos evidências da presença das boas
qualidades pelas quais almejamos humanamente: suprimento, saúde, força,
sabedoria, memória, plenitude de realizações. É a felicidade de viver sem
problemas. Mas cuidado: essa vivência sadia―não confundir com boa vida nos
padrões humanos―não deve ser nosso objetivo na aplicação da espiritualidade.
Pois, senão, estaríamos submetendo o emprego de valores espirituais para
atendimento de nossa vontade humana. Deus atende as necessidades, não as
vontades, do homem. Estaríamos sobrepondo os valores materiais e humanos aos
espirituais. Nossa meta é expressar as qualidades divinas e infinitas sem outra
intenção do que a de obedecer ao nosso Criador. A solução dos problemas humanos
ocorre natural e espontaneamente quando nossa consciência fica repleta dos
valores espirituais. Quando o pensamento está elevado, ele não contempla outra
coisa a não ser a manifestação do bem em todas as suas formas.
A aplicação da espiritualidade e a
aplicação da materialidade diferem desde o princípio. São movimentos em
direções opostas, sendo que na vida humana essa diferenciação acaba por anular
reciprocamente os efeitos. Para a consciência de pendor material (ou “pendor da carne” para usar termo
bíblico) é difícil contemplar os valores espirituais e sua manifestação na vida
do homem. Já a consciência de inclinação espiritual (ou o “pendor do espírito”) não vê nem experimenta o caos da
materialidade. A humanidade tem cometido um erro basilar ao longo dos tempos:
ela deseja a vivência sem problemas (o que não é incorreto) sem recorrer às
leis espirituais (o que é incorreto). Vale dizer: ela quer as benesses da
espiritualidade dentro da materialidade, como se ambas cooperassem ou agissem
em conjunto. A harmonia permanente é o efeito das leis espirituais que não são
submissas às pseudo leis materiais; esse termo—harmonia―inclui todas as formas
que já nos acostumamos a designar como boas: saúde, alegria, felicidade,
suprimento, amor, etc, etc.
Uma declaração de Mary Baker Eddy*
em Ciência e Saúde resume o exposto:
“Admitindo [no pensamento] somente aquelas conclusões cujos
resultados desejas ver concretizados no
corpo, tu te governas harmoniosamente” (p. 392).
.o0o.
* Mary Baker
Eddy, 1875; obra disponível na
Biblioteca Municipal.
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