quarta-feira, 24 de agosto de 2016

A lição de Naamã

Quando um mergulho restaura uma vida

     As Sagradas Escrituras estão repletas de narrativas de elevado valor moral e espiritual, as quais, devidamente compreendidas e interpretadas, adquirem atualidade.  O valor eterno da mensagem bíblica é assim demonstrado, dando-nos renovado interesse nesse Livro dos Livros.

     No segundo livro dos Reis encontra-se a história do comandante do exército sírio, Naamã, que foi a Samaria por conselho de uma menina israelita que servia em sua casa a procura de liberdade do seu temido mal: a lepra.

     Conta a narrativa que o profeta Elizeu, o "homem de Deus", mandou dizer a Naamã:
"Vai, lava-te sete vezes no Jordão, e a tua carne será restaurada, e ficarás limpo." 
A primeira reação do oficial foi de desprezo às palavras do profeta; mas, aconselhado por seus servos a obedece-las:
 "...desceu, mergulhou no Jordão sete vezes, consoante a palavra do homem de Deus; e sua carne se tornou como a carne de uma criança, e ficou limpo" (II reis 5: 1-19). 

     Nesse relato encontramos duas lições importantes e aplicáveis a todos os problemas humanos.  A primeira lição depreende-se do relato bíblico.  Naamã precisava desfazer-se da arrogância e da soberba, e tornar-se suficientemente humilde para crer nas palavras de Elizeu e obedece-las.  Uma vez cumprido o mandato, ele ficou livre para sempre do mal que era tido incurável.

     O profeta sabia, por meio da sua inspiração celestial, que essa virtude de ser humilde era o que o visitante deveria conhecer e começar a exercitar.  Com a humildade ele venceu o mal.  Será que Naamã, ao voltar a seu lar, não valorizou melhor a pequena serva israelita que, de sua humilde condição social, lhe indicou o caminho para a cura?

     Cristo Jesus dava grande importância a essa qualidade moral.  Por várias vezes teve que recomendá-la a seus discípulos, até que aprendessem.  O Mestre associava a humildade à pureza espiritual, como deixou claro ao evocar a infância como estado mental desejável para entrar no reino dos céus; ou quando repreendeu a disputa deles sobre quem seria o maior entre eles, e ainda quando lhes lavou os pés antes da ceia pascal num gesto decisivo e prático do que lhes havia ensinado.

     A segunda lição tem um cunho metafísico e é compreendida com auxílio da Ciência Cristã.  Mary Baker Eddy, a Descobridora e Fundadora da Ciência Cristã, dá no seu livro Ciência e Saúde com a Chave das Escrituras  a seguinte interpretação espiritual de rio:
"Canal do pensamento.  Quando manso e não obstruído, simboliza o curso da Verdade; mas lamacento, espumante e impetuoso, é o símbolo do erro" (p. 593).

     Aqui chegamos ao ponto fundamental da questão e ao ensinamento aplicável contemporaneamente.  A ordem foi para Naamã mergulhar sete vezes - vale dizer, persistir na ação - no canal do pensamento do "curso da verdade",  para ficar purificado.  Ele precisava lavar-se ou livrar-se do pensar mundano - que era o que lhe causava o problema.

     Tal como Naamã, também nós precisamos fazer algo ao nos confrontarmos com um problema.  Se algum mal chegou a se manifestar em nossa experiência é porque estávamos com o pensamento mergulhado no rio "espumante e impetuoso" da materialidade, o reino dos problemas.  Para nos livrarmos da desarmonia temos que sair daquele "rio" e mergulhar com toda humildade no "curso da verdade", da compreensão espiritual oposta à materialidade.  Essa é a linha de trabalho cristão para destruir qualquer das formas do mal, e é o que se observa em todas as experiências de cura espiritual e cristã efetuadas pelo poder de Deus.

     A oração que nos permite "mergulhar" no curso da Verdade e do Amor é a que reconhece a supremacia do Espírito, bem como a presença e poder absolutos de Deus.  Essa consciente comunhão com Deus, o bem supremo, se manifesta sensivelmente na experiência humana através da cura, ou da solução de outro problema.  A irrealidade do mal fica claramente exemplificada no gesto de lavar com água, resultando a eliminação tanto da doença (ou suas evidências) quanto da impureza física externa.  Cristo Jesus fez idêntica demonstração com o cego que foi mandado lavar-se no tanque de Siloé.  Diz a Bíblia que "ele foi, lavou-se e voltou vendo" (João 9:7).  É lógico que o poder curativo não estava na água do Jordão para Naamã como não estava na fonte para o cego.  O poder que deu esses resultados semelhantes em épocas e situações tão distintas, é o mesmo poder infinito e irresistível que atua hoje: o poder de Deus.

     Tive muitas experiências mediante a aplicação da Christian Science, mas uma delas ilustra melhor  o que foi dito.  Estava preparando a sala para Escola Dominical de um grupo de cientistas cristãos (que na época ocupava espaço na casa de meus pais para seus serviços religiosos), quando caí de uma pequena escada e torci levemente o pé direito.  Afirmei imediatamente a Verdade que uma ideia nunca cai, e muito menos uma idéia de Deus.  A dor diminuiu e pude terminar meu trabalho.  À noite, no entanto, a dor voltou e com mais intensidade, a ponto de quase não poder caminhar.  Fiquei preocupado com o dia seguinte pois deveria participar de um desfile na Escola Militar que frequentava.

     Senti-me um tanto inseguro quanto ao compromisso; então, para tranquilizar-me, tomei um exemplar de um Arauto da Ciência Cristã e nele encontrei um artigo que fazia referência à perfeição do homem espiritual, criado segundo a imagem, semelhança e reflexo de Deus.  Explicava, ainda, que o homem, como reflexo de Deus, não leva consigo um único elemento de erro.  Senti como se esta mensagem divina fora escrita para mim, e ela comigo permaneceu até me abençoar.

     Na manhã seguinte, quando saí de casa ainda sentia fortes dores e dificuldade de caminhar.  No trajeto até o quartel, meus pensamentos eram todos voltados para  a mensagem que lera e seu conteúdo espiritual.  Ocorre que me esqueci do problema e não senti mais dor, antes mesmo de chegar ao local do desfile, do qual participei durante mais de uma hora sem qualquer vestígio de dor.

    Essa experiência é um tanto paralela à de Naamã, pois tive de mostrar suficiente humildade de aceitar aquela mensagem inspiradora e mergulhar nas águas purificadoras do "rio" de pensamentos da Verdade, para achar o alívio que necessitava.  Quando assim procedi, manifestou-se a sempre-presença da lei divina de harmonia e perfeição.  Em Ciência e Saúde a Sra. Eddy esclarece o processo mental envolvido, ao afirmar: 
"Mantém o pensamento firme no que é duradouro, no que é bom e no que é  verdadeiro e os terás na tua experiência, na proporção em que ocuparem teus pensamentos" (p. 261).

     Por intermédio da Ciência do Cristianismo podemos aprender o valor real que as narrativas bíblicas têm para todas as épocas.  E, uma vez compreendidas e assimiladas, essas narrativas tornam-se como lições, cujos ensinamentos devemos aplicar no viver diário para deles tirar o máximo proveito.
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(Publicado nO Arauto da Ciência Cristã, de janeiro 1993 )

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